Crimes

Feminicídio e impunidade: o frio e cruel assassinato de Sandra Gomide

Um homem que não aceita o término de um relacionamento e mata a mulher que o abandonou é uma história que se repete com uma frequência imensa no Brasil.

A morte da jornalista Sandra Gomide é mais um exemplo desse tipo de crime. Na época, ela tinha 32 anos e havia namorado por quatro anos com Marcos Pimenta Neves, jornalista e então diretor do jornal “O Estado de São Paulo”. Os dois se conheceram em 1995, época em que trabalhavam no jornal Gazeta Mercantil. Sandra era formada em Jornalismo e Economia e quando Pimenta Neves foi convidado para trabalhar no Estadão, a levou como Editora de Economia.

Inicialmente, o namoro dos dois não era bem visto pela família, já que o jornalista era bem mais velho que Sandra, mas, segundo seu pai, ela era uma mulher independente e eles tiveram que aceitar a relação.

Quando o namoro entre Sandra Gomide e Pimenta Neves terminou, ele a demitiu do jornal e deu início a um processo constante de difamação do seu trabalho, o que a prejudicou profissionalmente. Não bastasse a perseguição profissional, Pimenta Neves a ameaçou de morte e chegou a agredi-la, o que fez com que Sandra registrasse um boletim de ocorrência contra o ex-namorado.

No dia 20 de agosto de 2000, Sandra Gomide foi até o Haras Setti na cidade de Ibiúna, São Paulo, local onde ela e o ex-namorado mantinham cavalos. Chegando lá, encontrou Pimenta Neves. Segundo testemunhas, ele estivera no local a manhã inteira cavalgando. Os dois discutiram, ele tentou levá-la até o carro, mas ela conseguiu se desvencilhar do seu agressor. Foi, então, que ele disparou o revólver, o tiro atingiu Sandra pelas costas e ela caiu. Um segundo disparo foi dado na cabeça da jornalista e ela morreu ali mesmo.

Pimenta Neves foi embora do local do crime e, dois dias depois, teve a sua prisão preventiva decretada. No entanto, ele estava internado no hospital Albert Einstein, pois havia ingerido 70 comprimidos de Lexotan e outros sedativos. Em seguida, foi transferido para uma clínica psiquiátrica e só foi preso quinze dias depois.

No sítio do jornalista em São Roque, a polícia encontrou dez balas de revólver calibre 38 e 32 e para pistola calibre 380. Foram apreendidas também gravações da secretária eletrônica do apartamento de Sandra nas quais haveria o registro de ameaças que Pimenta Neves teria feito à ex-namorada.

O jornalista ficou detido por apenas sete meses, já que o STF lhe concedeu o direito de responder ao processo em liberdade. Em 2006, ele foi julgado. A tese da defesa era a de que ele cometera o crime tomado por forte emoção. Pimenta Neves foi condenado a 19 anos de prisão, mas, mais uma vez, ganhou o direito de recorrer da sentença em liberdade.

Depois de muitos recursos, em 2011, ele foi preso. Em 2013, passou para o regime semiaberto e, em 2016, passou para o regime aberto.

Pimenta Neves sendo preso em 2011

Para os pais de Sandra Gomide, a sensação de impunidade é enorme. Desde que perderam a filha, os dois sofrem com problemas de saúde e com dificuldades financeiras, mas não conseguiram ver a justiça sendo feita e sequer receberam a indenização que lhes foi concedida pela Justiça. 

Leonilda e Florentino, pais de Sandra Gomide

Além de se ver no Brasil a repetição constante desse enredo de homens que matam mulheres após o término de relacionamentos, o desfecho dessa trama quase sempre é marcado pela sensação de que não houve efetivamente justiça. No caso de Pimenta Neves, ele gozou de sua liberdade por mais de dez anos depois de ter tirado a vida de Sandra Gomide, ficou encarcerado por apenas cinco anos e, amparado pela lei, conseguiu novamente a sua liberdade. Uma punição que, conforme os pais da vítima, não chega nem perto do tamanho do crime que ele cometeu e da dor permanente que ele lhes causou.

Referências:

https://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/pop_tiro.htm

https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/logos/article/view/33114

https://istoe.com.br/94863_AS+OUTRAS+VITIMAS+DE+PIMENTA/

SILVA, Amanda Alves da. “Memórias de violência”. Revista Feminismos. Vol. 7, nº 2. Maio-agosto 2019. https://www.rbspa.ufba.br/index.php/feminismos/article/view/38682/23183

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