História do Brasil

A Guerra do Pinheirinho: um conflito que dizimou uma comunidade religiosa no Rio Grande do Sul

Nos primeiros anos do século XX, um grupo se instalou em uma área conhecida como Pinheirinho, em Roca Sales, região do Vale do Taquari, próximo à colônia de Encantado no Rio Grande do Sul. Essas pessoas eram lavradores, que viviam na miséria e seguiam um religioso conhecido como Monge Chico. Descritos pelos historiadores como “caipiras, mulatos e caboclos” e pelos jornais como “facínoras, fanáticos e bandidos”, eles começaram a incomodar os imigrantes europeus que ali viviam.

Rapidamente, se espalhou a notícia de que aqueles homens e mulheres eram fanático-religiosos, vagabundos, bandidos que traziam terror à comunidade local.

Conhecidos como “Monges de Pinheirinho”, eles incomodavam a igreja, por pregarem uma doutrina religiosa que fugia das regras da instituição; incomodavam os proprietários de terra, que temiam uma invasão de suas propriedades e incomodavam o governo, pois era um grupo que tinha organização própria.

Os líderes dos monges eram João Enéas, João Maria de Jesus, Antonio Lisboa e Cananeia, mulher conhecida como a orientadora espiritual do grupo e que tinha a função de tocar o sino da capela que eles construíram.

Os jornais da época chamavam o líder do grupo de “Munche”, que, provavelmente, era uma variação da palavra monge em alemão, e diziam que eles estavam tirando a paz dos moradores da colônia de Encantado.

O grupo era formado por cerca de 50 pessoas, que se reuniam ao redor do Munche e acendiam velas e faziam orações diante de uma cruz levantada no terreno onde viviam.  O Munche não pertencia a nenhuma ordem religiosa, era um beato andarilho que seguia as ideias do eremita italiano João Maria de Agostini, um missionário que havia passado pelo Rio Grande do Sul algumas décadas antes e que unia estratégias de cura de doenças e devoção religiosa.

Os monges de Pinheirinho viviam da caça, da pesca e de algumas doações que recebiam em troca de orações pela cura de doentes. Quando se fixavam em algum lugar, cultivavam erva-mate, construíam casebres de madeira e dividiam as tarefas do dia, sempre deixando um horário para as rezas conduzidas pelo líder do grupo.

Segundo os colonos, o grupo tinha armas e praticava saques na região. Isso foi o motivo do confronto entre eles. Em 1902, 11 sitiantes entraram em confronto com os monges. Nesse primeiro combate, oito monges e dois sitiantes morreram. O segundo enfrentamento aconteceu logo depois e, dessa vez, os sitiantes contaram com a presença da Polícia Militar. Nenhum imigrante saiu ferido, mas morreram 20 monges, que se viram encurralados pela polícia no rancho em que viviam. Além disso, sete homens foram capturados e alguns conseguiram fugir.

A tropa composta por 110 policiais da Brigada Militar chegou à região em 6 de abril de 1902 e só deixou o local no dia 15. Eles usaram em combate a técnica da degola, prática muito utilizada durante a Revolução Federalista no Rio Grande do Sul e na qual alguns dos monges havia lutado.

Os monges de Pinheirinho foram massacrados pela polícia e essa ação foi aprovada pelos moradores da região, que os julgavam bandidos violentos e aclamaram como heróis os chefes da ação que os dizimara. Como em muitas outras situações desse tipo, quem ousa se organizar em torno de crenças diferentes daquelas de quem detém o poder é exterminado, sob a alegação de que é um inimigo perigoso, quando, na verdade, esses homens e mulheres buscavam apenas uma forma de sobreviver à miséria que marcava as suas vidas.

Referências:

https://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,guerra-do-pinheirinho-imp-,655597

https://editora.pucrs.br/edipucrs/acessolivre/anais/ephis/assets/edicoes/2017/arquivos/46.pdf

https://www.univates.br/bdu/bitstream/10737/509/3/2011MirceleGiaretta.pdf

MONTEIRO, Duglas Teixeira. Os errantes do novo século: um estudo sobre o surto milenarista do Contestado. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1974.

FERRI, Genuíno Antônio. Os monges do Pinheirinho. Encantado: Gráfica Encantado, 1975.

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