Biografias

A história de Cintura Fina: a travesti que levou às ruas a arte da defesa pessoal com navalha

Cintura Fina é uma personagem bastante conhecida na história de Belo Horizonte. Ela ganhou projeção nacional ao ser interpretada por Matheus Nachtergaele na minissérie “Hilda Furacão”.

Matheus Nachtergaele interpretando Cintura Fina

Nascida em 3 de maio de 1933, em Fortaleza, foi batizada como José Arimateia Carvalho da Silva. Perdeu a sua mãe no parto e foi criada por três tias. Aos 14 anos, foi estudar em um seminário e ali descobriu a sua sexualidade. Apaixonou-se por dois primos que eram seminaristas e com eles teve a sua primeira experiência homossexual. Com medo de envergonhar a família, abandonou a casa das tias e passou a viver na zona de meretrício de sua cidade natal.

Acabou se tornando uma pessoa errante e viajou por Pernambuco, Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro, até fixar-se em Belo Horizonte em 23 de maio de 1953. Ali passou a viver em Lagoinha, bairro boêmio da capital mineira e a frequentar a zona do baixo meretrício.

Dizem que a sua alcunha foi inspirada nos versos de Luiz Gonzaga e Zé Dantas: “Vem cá, cintura fina, cintura de pilão/ Cintura de menina, vem cá meu coração”. Negra, alta, magra e de corpo acinturado, o apelido caiu-lhe como uma luva. Além disso, em sua cintura ostentava uma navalha amarrada a um elástico e tinha muita habilidade em seu manejo, fazendo uso da arma toda vez que se sentia ameaçada ou quando via alguém que ela julgava indefeso em perigo.

Além do apelido de Cintura Fina, adotava também o nome de Esther Williams, uma nadadora e atriz americana. Adotar mais de um nome era comum entre as prostitutas daquela época. Era uma forma de fugir da polícia e evitar problemas quando aplicavam golpes em clientes.

Ao longo da vida, envolveu-se em diversas brigas e sofreu inúmeras agressões policiais. Vivendo em uma época em que o preconceito contra travestis era recorrente, ela reagia aos abusos que sofria e isso a tornava um alvo fácil da polícia, acumulando em sua ficha criminal diversas detenções e acusações por desacato e envolvimento em brigas.

Usando maquiagem, seios postiços, brincos, pulseiras e calça comprida justa, ela desafiava os costumes da época e era muito determinada na defesa dos mais vulneráveis, principalmente das prostitutas.

Cintura Fina e dona Naná, mulher a quem ela adotou como uma mãe de criação

Cintura Fina ganhou a vida se prostituindo, mas também aprendeu o ofício da costura durante o período que passou no presídio de Ilha Grande, no Rio de Janeiro. Ali também conheceu Madame Satã, uma das mais famosas travestis do Rio de Janeiro.

Até hoje o nome de Cintura Fina é lembrado em Belo Horizonte, sua fama de valente e a perícia com que manejava a sua navalha deram-lhe muitas histórias e também várias marcas no corpo, fruto de ferimentos durante as muitas brigas em que se envolvera ou provocadas por abusos policiais.

Com uma longa ficha policial, muitas confusões e as mais variadas tentativas de encontrar o seu lugar em um país marcado pela violência e preconceito contra travestis, Cintura Fina passou os últimos anos de sua vida em Uberaba, onde morreu aos 62 anos de idade.

Referências:

https://www.otempo.com.br/diversao/livro-resgata-e-humaniza-a-trajetoria-da-iconica-travesti-cintura-fina-1.2440214

https://www.hojeemdia.com.br/almanaque/%C3%ADcone-lgbt-de-belo-horizonte-travesti-cintura-fina-ganha-biografia-1.821121

http://repositorio.ufpa.br/jspui/bitstream/2011/6714/1/Dissertacao_HildaFuracaoPeriplo.pdf

MORANDO, Luiz. “Enverga, Mas Não Quebra: Cintura Fina em Belo Horizonte”. Uberlândia: Editora O Sexo da Palavra, 2021.

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