A ascensão e queda de Asa Branca, o maior locutor de rodeio da história do Brasil
O sucesso de Asa foi tão meteórico quanto sua terrível queda na amargura, pobreza e doença
Barretos, 1995, um homem está em seu camarim, toma quatro doses de Jack Daniels, reza uma Ave Maria, um Pai Nosso, sobe em um helicóptero e pousa na arena de rodeio mais famosa do Brasil. Seu nome, Waldemar Ruy dos Santos, conhecido nas arenas de todo o Brasil como Asa Branca.
Waldemar nasceu em Turiúba, uma pequena cidade de 3000 habitantes no noroeste paulista. Filho de uma família pobre, desde pequeno, acostumou-se com as durezas da vida. Quando ainda era criança, perdeu a mãe para a Doença de Chagas. Aos 15 anos, o pai matou a própria namorada, após uma crise de ciúmes e, depois, por arrependimento ou desespero, tirou a própria vida.
Adolescente, sem dinheiro, sem herança, passou a trabalhar como servente de pedreiro e a fazer bicos lavando cavalos.
Foi nessa época que se apaixonou por montaria. Com o apelido de Asa Branca, por gostar muito de passarinhos, Waldemar passou a montar em bois, até sofrer um acidente, perfurar o pulmão e nunca mais poder subir em um animal. Durante a recuperação, teve contato com fitas de grandes locutores como Zé do Prato. Começou, então, a ir em rodeios e a pedir para dar palinhas no microfone. Uma certa vez, um locutor faltou e Asa entrou em seu lugar. Foi o passaporte para mostrar seu carisma e revolucionar o ramo.

Nos anos 90, os rodeios faziam muito sucesso e não tinham a reprovação da opinião pública como é hoje. Asa Branca transformou o locutor, que na época era coadjuvante, em protagonista do show. O narrador alugava helicópteros, rezava, fazia versos para cativar o público. Ficava dentro da arena com boi e pião. Foi ele que inseriu as queimas de fogos nas principais festas de peão do país. Em meados dos anos 90, namorou famosas como Alexia Dechamps e Marília Gabriela.
Com um sucesso estrondoso, recebendo mais de 300 mil reais por mês, Asa passou a levar uma vida desregrada. Ele disse em diversas entrevistas que chegava a transar com dez mulheres em um dia. Raramente usando preservativos. Eram tietes, famosas, garotas do trabalho, prostitutas. Com o sucesso arrebentando na porta, passou a andar com sertanejos famoso, fazendeiros e virou dependente de cocaína e álcool. A vida desregrada e excessos cobrariam seu preço.
Em 2007, durante o rodeio de Barretos, Asa Branca passou mal e foi hospitalizado. Em seu rosto estavam estampadas marcas roxas. Em poucos dias, ele havia perdido muito peso, era acometido por uma febre que não cessava.

O diagnóstico foi certeiro. Asa Branca estava com AIDS, a doença que mais assustou o mundo nos anos 80 e 90. Debilitado, passou a sofrer preconceito e parte das produções de grandes rodeios boicotaram a sua voz.
É nesse momento que o homem com nome de pássaro inicia uma queda vertiginosa ao solo. Os poucos rodeios e festas que conseguia não davam para pagar o aluguel. Sua fortuna foi se dilapidando, amigos desapareceram concomitantemente à quantidade de dinheiro que ia embora.
Pobre, sem emprego, com complicações em decorrência da terrível doença, Asa Branca se afasta e muda para Bertioga, litoral de São Paulo. Em 2010, o homem que havia narrado rodeios do Texas a Porto Alegre, que aparecia em capas de revistas, que inseriu o microfone sem fio nas festas de peão e transformou as arenas em um show à parte, mudou-se para o litoral e casou-se com uma amiga de infância, também soropositivo. Como Asa Branca mesmo falava, essa era a companheira que lhe devolveu asas, um anjo em sua vida.

Em 2011, após passar 90 dias no hospital Emílio Ribas, a vida de Asa começa a chegar próxima do fim. Vivendo com a ajuda de alguns amigos como Sérgio Reis e o ex-jogador Luizao e prestando alguns serviços de locução aqui e ali, ele foi sobrevivendo até descobrir um câncer na garganta, que somado à AIDS, causou um triste sofrimento e provocou a sua morte.
Então, em 4 de fevereiro de 2020, em uma manhã quente, com ar úmido, Asa Branca faleceu em decorrência de complicações após uma internação no Instituto do Câncer de São Paulo. Alguns anos antes de morrer, em sua última entrevista a um grande veículo de comunicação, Asa Branca se colocou contra os rodeios, disse que se arrependia de ter feito tanto bicho sofrer: “Eu entendo minhas forças, elas são resultado da prática e do incentivo à violência contra bois e cavalos, feitas durante todos esses anos”.
Referências:
https://vejasp.abril.com.br/cidades/asa-branca-locutor-rodeios/