Biografias

Dr. Jacarandá: uma das inspirações para a criação do personagem Zé Carioca

A figura do malandro faz parte do estereótipo do brasileiro. Durante muito tempo, a ideia do jeitinho brasileiro foi motivo de orgulho no país, como se fosse uma virtude do povo brasileiro sempre encontrar saídas para se safar das mais diversas situações.

Segundo Antônio Candido, o personagem Leonardo de “Memórias de um sargento de milícias”, publicado em 1853, foi o primeiro malandro da história da nossa literatura. Depois dele, Macunaíma, de Mário de Andrade, lançado em 1928, explicitou as origens da malandragem brasileira.

Em 1942, essa figura do malandro brasileiro ganhou projeção mundial com a criação do personagem Zé Carioca por Walt Disney. A principal inspiração para a criação desse personagem foi o músico José do Patrocínio Oliveira, conhecido como Zezinho, mas outra figura tipicamente brasileira serviu de mote para a criação do Zé Carioca, Manuel Vicente Alves Palmeira, conhecido como Dr. Jacarandá. Foi inspirado nele que foi criado o primeiro figurino do papagaio famoso: o fraque, o chapéu, o guarda-chuva e o charuto.

Manuel Vicente nasceu em Palmeira dos Índios, Alagoas, em 25 de abril de 1869. Proveniente da cidade onde Graciliano Ramos foi prefeito, ele teve a sua história contada pelo escritor em seu livro “Viventes das Alagoas”.

Em 1904, Manuel chegou ao Rio de Janeiro, onde trabalhou como quitandeiro, peixeiro, apanhador de papéis velhos, estivador e crido em casas de família, mas foi como rábula que ganhou a alcunha de Dr. Jacarandá e se tornou conhecido a ponto de seus trajes servirem de inspiração ao Zé Carioca.

Exercendo o ofício da advocacia sem nunca ter cursado Direito, o Dr. Jacarandá era muito bom de lábia e conseguiu vencer diversas contendas judiciais. Ele dizia ser especialista em ações de despejo e andava pela Praça Onze, trajando seu fraque com um cravo na lapela e carregando uma pasta cheia de papéis.

Em 1922, candidatou-se a deputado e tinha como promessa de campanha defender as meretrizes. Não ganhou a eleição, mas tornou-se ainda mais conhecido por causa de seus discursos marcados por um português bem popular e por um tom de chacota, de quem sabia explorar a malandragem para conseguir algumas vantagens.

Com seu cavanhaque repartido em duas partes, seu monóculo e sua voz poderosa, se apresentava como um defensor dos pobres e dizia que seus clientes poderiam confiar nele, pois era “igual ao jacarandá, um pau para toda obra”. Outra explicação para o seu apelido é que era um “advogado de porta de cadeia” e, naquela época, as prisões eram construídas com tábuas de jacarandá.

Sem ter concluído a educação primária, Dr. Jacarandá se apresentava como “doutor”, conhecia e citava artigos do Código Penal, tinha decorado algumas frases em latim e conseguiu várias vitórias no tribunal. Viveu pobremente em um quarto alugado, de onde chegou a ser despejado, atendia seus clientes em mesas de bar e era alvo de críticas e até processos de advogados que não admitiam que ele exercesse o ofício sem ter formação.

Morreu em 19 de julho de 1948. Seu filho veio de Alagoas para garantir que tivesse um enterro digno. Foi enterrado no Cemitério Ricardo de Albuquerque e entrou para a história como mais um dos personagens singulares que compõem o Brasil.

Referências:

RAMOS, Graciliano.  O dr. Jacarandá. (fev. 1941). In: _____. Viventes das Alagoas. Posfácio de Hélio Pólvora. 19. ed. Rio de Janeiro: Record, 2007.

https://almanaquenilomoraes.blogspot.com/2016/07/um-tipo-folclorico-do-rio-antigo.html

https://www.historiadealagoas.com.br/

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