500 mortos e comoção nacional: O incêndio do Gran Circo Norte-Americano
Conheça a história do terrível evento que levou a óbito mais de 500 pessoas e é considerado, até hoje, a maior tragédia da história do Brasil.
1961 foi um ano bastante agitado na história do Brasil. A crise política tomava conta de Brasília, Jânio Quadros renunciou ao mandato de presidente, a ex-miss Brasil Marta Rocha engravidou, os Estados Unidos cortaram definitivamente relações econômicas com Cuba, alterando para sempre as relações políticas na América Latina. Mas nada foi tão trágico como o evento ocorrido no dia 17 de dezembro quando, durante uma apresentação de circo, o mundo veria uma das piores tragédias da história da humanidade.
O Gran Circo Norte-Americano estreou em Niterói em 15 de dezembro de 1961. Os anúncios diziam que era o maior e mais completo circo da América Latina – tinha cerca de 60 artistas, 30 empregados e 150 animais. Em 10 de dezembro, o circo chegou a Niterói, na época capital do Rio de Janeiro. O dono do estabelecimento, Danilo Stevanovich, investiu pesado em propaganda, pois havia trocado a lona do Circo. Em um investimento audacioso, mandou fazer uma lona de náilon, com mais de seis toneladas, o que aumentou consideravelmente a capacidade de público, algo impressionante e incomum para a época.
Ao chegar a Niterói, o proprietário contratou cerca de 50 trabalhadores avulsos para a montagem. Um deles, Adílson Marcelino Alves, conhecido como Dequinha, tinha antecedentes por furto e apresentava problemas mentais. Dequinha arrumou algumas confusões com o porteiro do circo e foi trabalhar bêbado, causando sua demissão. Inconformado com a dispensa, passou a rondar as imediações do circo.
Segundo a polícia, na tarde de 17 de dezembro de 1961, Dequinha se reuniu com José dos Santos, o Pardal, e Walter Rosa dos Santos, o Bigode, para colocarem em prática o plano de queimar o circo. Eles se encontraram num local denominado Ponto de Cem Réis, e decidiram pôr em prática o plano de vingança. Um dos comparsas de Dequinha, responsável pela compra da gasolina, advertiu os futuros criminosos sobre o grande risco de morte. Porém, Dequinha estava irredutível: queria vingança e dizia que Stevanovich tinha uma grande dívida com ele.
Com três mil pessoas na plateia, faltavam 30 minutos para o fim do espetáculo, quando uma trapezista notou o foco de incêndio e deu o alarde. Em pouco mais de cinco minutos, o circo foi completamente devorado pelas chamas. 372 pessoas morreram na hora e, aos poucos, o saldo de mortes oficial chegou a 504 vítimas, das quais 70 % eram crianças, fora os feridos e desaparecidos. O resultado da tragédia só não foi maior, pois uma elefante africana, pertencente ao circo, conseguiu escapar e abriu uma nova saída, permitindo a sobrevivência de muitas pessoas.
O que poderia ser uma tragédia sem precedentes, a qual causaria um luto paralisante, se transformou também em uma das maiores ações de solidariedade da história da humanidade, mostrando que, apesar do momento político extremamente conturbado e dos inúmeros problemas, dificuldades e divergências, o brasileiro é um povo que não abandona a ternura e a tendência à solidariedade.Uma onda de voluntariado e empatia tomou conta do Brasil naquele final de ano de 1961. No dia da tragédia, o maior hospital de Niterói encontrava-se fechado, a porta foi arrombada por moradores da área, médicos de todo o Rio de Janeiro e do Brasil se locomoveram até a capital do Rio, artistas, figuras ilustres e a população em geral se reuniram com funerárias, as quais trabalharam gratuitamente, ajudando o corpo de bombeiros e profissionais de resgate na triste missão de tirar corpos debaixo dos escombros do incêndio. Carpinteiros das regiões próximas trabalharam noite e dia para produzir caixões e dar aos mortos um enterro digno, um cemitério precisou ser construído para enterrar as vítimas.
O cirurgião plástico Ivo Pitangy chefiou uma grande equipe de cirurgiões plásticos, dando uma contribuição decisiva para a reconstrução do rosto de muitas crianças e adultos. Toneladas de garrafas de água e mantimentos foram arrecadadas. O Papa rezou uma missa em homenagem às vítimas e enviou um cheque como forma de apoio. Artistas de todo o Brasil se engajaram em uma grande campanha de doação de sangue para as vítimas.
Ao longo de todo o mês de janeiro, o presidente Jango visitou os hospitais nos quais os feridos estavam internados. Durante diversos dias, a população se juntou aos garis na limpeza dos escombros deixados pelo incêndio.
O episódio marcou também o início da caminhada do famoso “Profeta Gentileza”, um microempresário do setor de transportes que, logo após a tragédia, disse ter ouvido vozes as quais lhe pediam para abandonar o mundo material, assim, ele vendeu tudo que tinha, mudou-se para o local do incêndio e, durante quatro anos fez das cinzas e das marcas da tragédia no chão uma horta e um campo de flores e passou a confortar os familiares das vítimas com suas palavras de bondade. Depois de deixar o local da tragédia, ele percorreu o Rio de Janeiro espalhando mensagens pelos viadutos e incentivando as pessoas a serem gentis com seus semelhantes. Dentre as belas palavras que pregava, a conhecida frase: “Gentileza gera Gentileza”, era um dos seus motes.
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Abaixo o vídeo dessa tragédia em nosso canal do Youtube.
Referências:
Ventura, Mauro. O espetáculo mais triste da Terra : o incêndio do Gran CircoNorte-Americano / Mauro Ventura. — São Paulo : Companhia dasLetras, 2011.
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