A trajetória de Luís XVI, o rei mais desafortunado da história
De acordo com uma crônica publicada no jornal antimonarquista “Magicien Républicain”, às 10h15, a carruagem que trazia o rei Luís XVI chegou à Praça da Revolução. Ali, a guilhotina estava preparada para executar o último monarca do Antigo Regimes francês, no dia 21 de janeiro de 1793.
O rei negou até o último minuto que fosse responsável pelos crimes de que o acusavam. A sua morte marcou a história da França. Naquele momento, o reino francês passava por uma grave crise econômica e política e o rei e a sua família foram responsabilizados por isso. Assim, a guilhotina foi o destino de grande parte da família real.
Embora seja lembrado como fraco e corrupto, conforme o historiador francês Jean-Christian Petitfils, Luís XVI era muito mais do que o estereótipo pelo qual ficou conhecido. Ele foi decisivo na Guerra de Independência dos Estados Unidos. Ao apoiar os colonos norte-americanos, fornecendo-lhes armas, uniformes, dinheiro e tropas, o rei francês contribuiu muito para que o processo de independência se concretizasse.
Essa ação garantiu-lhe popularidade entre os franceses, tornando-o conhecido como um rei vitorioso. A empreitada bélica, entretanto, custou caro aos cofres franceses, fazendo com houvesse um aumento dos impostos e o descontentamento começasse a crescer entre a burguesia e a população mais pobre. Nesse contexto, nasce a Revolução Francesa.
Tomando como base ideais de liberdade, igualdade e fraternidade e inspirando-se no processo de Independência dos Estados Unidos, os franceses se mobilizaram para depor Luís XVI e a sua esposa Maria Antonieta. Desse modo, o rei teve a sua a cabeça cortada e entrou para a história como o rei que foi morto por decisão do povo. De acordo com historiadores franceses que se debruçaram sobre o período em que ele governou, é preciso entender Luís XVI como muito mais do que o rei guilhotinado.
Ao longo de seu reinado, Luís XVI teve um papel importante na abolição da servidão. Influenciado por intelectuais como Voltaire, ele aboliu o regime de servidão em todas as propriedades reais e esperava que os nobres franceses fizessem o mesmo. No entanto, eles não seguiram o monarca e a servidão só foi totalmente abolida na França em 4 de agosto de 1789, quando a Assembleia Nacional Constituinte extinguiu todos os privilégios feudais que os nobres insistiam em manter.
Luís XVI teve um papel importante no apoio à ciência, incentivando uma expedição científica ao redor do mundo. A viagem tinha como objetivo criar novos entrepostos comerciais, localizar novos povos e fazer um mapeamento do mundo. Seu final, porém, foi trágico. Os dois navios franceses afundaram, o que ocasionou a morte de 227 pessoas que estavam a bordo.
Ele também foi importante no desenvolvimento intelectual do país, montando uma biblioteca com mais de 8 mil livros, fundando a Escola de Medicina de Paris, em 1774, atual Université Paris Descartes. Além disso, foi um grande apoiador das artes e da poesia e reconheceu legalmente religiões como o judaísmo e protestantismo huguenote.
Luís XVI aboliu o uso da tortura como método de conseguir confissões nos tribunais franceses e deu os primeiros passos para a abolição da pena de morte, mesmo que tenha sido vítima dela.
Ele se tornou herdeiro do trono francês porque seu pai e seu irmão mais velho acabaram morrendo. Segundo historiadores, naquele momento, o país passava por uma séria crise política e econômica. Com 19 anos, ele era jovem demais e não havia sido devidamente preparado para assumir essa responsabilidade. Além disso, era questão de tempo ocorrer uma Revolução em solo francês, por isso, o clima no país era bastante tenso. A derrotas francesas nas guerras de Sucessão Espanhola (1701-1714), de Sucessão Austríaca (1740-1748) e dos Sete Anos (1756-1763), afundaram o país em uma imensa dívida. E, para piorar a situação, a erupção do vulcão Laki, no sul da Islândia, devastou a agricultura do Hemisfério Norte, afetando diretamente a França. Um dos impulsos para a Revolução Francesa foi justamente a escassez de pão em Paris.
Luís XVI tentou resolver os problemas que marcavam o território francês. Cortou gastos, aboliu cargos públicos, procurou mudar o sistema fiscal francês e reduzir o peso dos impostos na vida das pessoas mais pobres. Suas ações, entretanto, irritaram a nobreza e o clero e uma forte tensão política foi instaurada. Sem apoio dos nobres, ele não conseguiu implantar efetivamente as suas propostas e se viu diversas vezes boicotado pela nobreza.
Além disso, o fato de sua esposa, Maria Antonieta, ser austríaca, espalhou uma onda de xenofobia entre os franceses, que a responsabilizavam pelos problemas pelos quais o país passava. Corriam boatos de que os seus gastos é que tinham destruído as reservas do reino. Daí teria surgido a frase com a qual ela ficou conhecida: “Se não tem pão, que comam brioches”.
Para o professor Serna, Luís XVI pagou as consequências da política externa desastrosa de seu avô Luís XV e da ostentação do Luís XIV. Segundo Serna, Luís XVI era a pessoa errada na hora errada e foi um dos reis mais desafortunados da história. Por um azar do destino, herdou um trono que não deveria ser seu, já que era o terceiro na linha sucessória e acabou lidando com conflitos políticos e sociais que não conseguia resolver.
Com o desemprego em alta, a produção de alimentos em crise, os preços elevadíssimos e um descontentamento geral, a Revolução Francesa teve início. A execução de Luís XVI na guilhotina marcou o período que ficou conhecido como “O Terror”, entre os anos de 1793 e 1794. A queda da Bastilha de 14 de julho de 1789, tornou-se o símbolo do fim do Antigo Regime francês e Luís XVI entrou para a história como o monarca que foi executado durante a Revolução.
Referências:
https://www.scielo.br/pdf/topoi/v13n25/1518-3319-topoi-13-25-00228.pdf
https://revistas.pucsp.br/revph/article/viewFile/17137/14208
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/resgate/article/view/8645493