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Encarando o Diabo: o cinematográfico dia em que uma cidade se juntou para enfrentar Lampião

O evento, real, poderia muito bem ser a cena final de um filme épico de bang bang

Há histórias, principalmente em nosso Brasil, que parecem ter saído de um filme épico de ação. Um desses contos reais foi a tentativa de Invasão do perigoso Lampião e seu bando à cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Em 1927, Virgulino já era um conhecido bandido do Nordeste brasileiro. Temido por grande parte da população, Lampião comandava quatro bandos de Cangaceiros. Exatamente na metade do ano citado acima, Lampião resolve invadir Mossoró. Na época, a cidade do Rio Grande do Norte possuía 20 mil habitantes e era considerada um polo salineiro no Brasil. O município estava entre os três maiores produtores de sal do país. Além dessa produção, havia a estrada de ferro, perfuração para a retirada de petróleo e um centro cultural pujante, o que fazia de Mossoró um local rico para as condições da época.

Lampião e membros de seu bando
Mossoró, em 1927


Desse modo, a cidade chamou a atenção dos cangaceiros, que resolveram invadir o local.
Como Lampião sabia que a cidade era rica e tinha condições de oferecer boa resistência, juntou-se com outros três grupos de cangaceiros, que obedeciam as suas ordens, mas tinham autonomia para fazer os próprios saques.
No dia 10 de junho, então, Lampião juntou seu bando e foi em direção à cidade. Ficando há alguns quilômetros do local, enviou homens para sequestrar um importante Coronel da Região.
Em poder do Coronel, Lampião envia uma mensagem para o prefeito da cidade, Rodolfo Fernandes, exigindo 400 contos de réis para não invadir o município e liberar o sequestrado.

Coronel Antonio Gurgel Amaral, homem sequestrado por Lampião
Rodolfo Fernandes – Prefeito de Mossoró


O prefeito chama o mensageiro de Lampião e o leva até uma sala cheia de caixões, mostrando ao cangaceiro uma enorme quantidade de caixas fúnebres e munições. Ele disse que a cidade só poderia pagar 21 contos de réis aos cangaceiros. Virgulino, quando ficou sabendo da resposta do prefeito, resolveu invadir Mossoró, ele contava com mais de 50 homens.

Bilhete escrito à mão por Lampião


Rodolfo, então, contratou um tenente de Apodi, uma cidade próximo a Mossoró, e organizou a resistência com homens voluntários. Mais de 200 homens se voluntariaram para pegar em armas. Rodolfo tentou mais homens com o governo federal e estadual, porém conseguiu apenas armas e munições.

Homens da resistência mostram suas armas


Os mossoroenses doentes, crianças e mulheres deixaram a cidade e o grupo que faria resistência se colocou nos tetos das casas e da igreja principal. Até o padre carregava arma branca e abençoava os cidadãos que ali estavam.
Ao entardecer do dia 13 de junho, uma fina chuva caía sobre Mossoró, Lampião e seus capitães Jararaca e Colchete estavam à frente do grupo fortemente armado.

Grupo de Lampião fortemente armado


Ao chegarem à entrada do município, o sino badalou e o prefeito perguntou: “Quem vem lá?”
O cangaceiro respondeu: “Aqui é Lampião, vim tomar a cidade”.
Após a frase, os primeiros disparos foram ouvidos. Homens saíram com facas por trás para cercar o bando, enquanto atiradores de cima do prédio disparavam sem dó em direção ao bando. Logo nos primeiros segundos, importantes cangaceiros cairiam ao chão. Colchete, um dos capitães, foi morto. E Jararaca, temido chefe e matador, foi capturado. Para não perder mais homens, Lampião partiu em cavalgada sem descanso o mais longe possível da cidade. Cansado, assustado e sem comida, liberou os reféns que havia feito na cidade e partiu para o estado da Paraíba.
Jararaca foi julgado e enterrado vivo por membros da cidade.

Jararaca, no centro, um dos homens mais poderosos do bando de Lampião é capturado



O feito entrou para a história como um dos principais movimentos de resistência ao cangaço de que se tem notícia. O evento, significativo e muito importante para a história do Nordeste e do Brasil, mostra a importância da resistência para a sobrevivência do homem sertanejo em meio a uma vida dura e a uma terra sem leis.
O fato marcou para sempre a vida de Lampião, sua tropa e o feito impulsionou e deu força para o início da caçada aos bandos do cangaço. Caçada que durou até o fim de sua existência, com a morte de seus principais líderes ao final dos anos 30.

Curiosidade: Também foi em 1927 que a primeira mulher da história do Brasil votou. Seu título e voto foram computados em Mossoró. A cidade era bastante avançada para a época.

Referências:

Polígono, Revista da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço. Mossoró,
Fundação Vingt-un Rosado, 1997. (Coleção O Mossoroense – série C. v. 963 v. 8 –
Ano I).

SOBRINHO, José Saldanha Menezes. “O livro de Lampião sua história, seu tempo e
suas lutas”. Mossoró: Fundação Vingt-un Rosado, 1996. (Coleção Mossoroense –
série D – cordel – n. 006).

REGO, José Lins do. “Cangaceiros”. Rio de Janeiro: José Olympio, 1999.

HONORATO, Aldivam. “Entrada de Lampião em Mossoró”. 2. ed.
Mossoró: Fundação Vingt-un Rosado, 1997. (Coleção O Mossoroense, Série “B” –
Folheto: n. 264).

ALVES, Antônio Robson de Oliveira. A memória em Foco: O uso da memória do cangaço a serviço do turismo na cidade de Mossoró/RN.

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