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De morador de rua à ícone do samba: a trajetória de Bezerra da Silva

José Bezerra da Silva nasceu em 1927, na cidade de Recife, Pernambuco. De uma família pobre, foi abandonado pelo pai ainda na barriga da mãe. A genitora conseguia o pouco dinheiro para criar o filho através de faxina e lavagem de roupas para a vizinhança.


O garoto cresceu pelas ruas da cidade e conseguiu ingressar, com 14 anos, na Marinha Mercante. Por já tomar uns tragos e não obedecer aos horários de trabalho, José foi mandado embora da instituição e resolveu partir para o Rio de Janeiro que, na época, recebia um mar de migrantes.
Bezerra recebeu informações da família dizendo que seu pai se encontrava na capital, então o pernambucano parte para o Rio e encontra o genitor. A relação entre os dois, que não se conheciam, ocorreu de forma muito conflituosa e logo José se viu sozinho no mundo. Desempregado e sem ajuda, começa a trabalhar na construção civil como pintor.


Em 1950, frequentando bares e rodas de samba, Bezerra se apaixona por uma moça e vai morar com ela no Morro do Cantagalo, o local foi muito importante para trajetória de sua vida pessoal e artística. Foi na comunidade que Bezerra teve seus primeiros contatos com o samba, através do bloco carnavalesco “Unidos do Cantagalo”. Como seu primeiro nome, José, era muito comum entre os homens da época, logo começaram a chamá-lo de Bezerra da Silva. Ao frequentar o Coco, um tipo de dança típica de origem africana, Bezerra conhece Jackson do Pandeiro e inicia sua vida artística.
Em 1954, após se separar da primeira esposa, Bezerra passa a beber bastante e, ao perder o emprego, mora por pelo menos dois anos nas ruas de Copacabana, vivendo de caridade e pequenos golpes. Nesse período bastante obscuro da vida do artista, Bezerra chegou a tentar suicídio.


Após anos de terrível condição nas ruas do Rio de Janeiro, Bezerra fez amigos nos bares da cidade e conseguiu se incluir a partir do Samba. Tendo a ajuda de Jackson do Pandeiro e de produtores musicais que frequentavam Copacabana, Bezerra da Silva consegue lançar suas primeiras duas músicas no disco de Jackson do Pandeiro. Mas foi nos anos 60 que o sambista consegue que cantores de renome como Marlene e Norival Reis incluam as suas músicas em suas produções.


Foi só no final dessa década, porém, que Bezerra da Silva atingiu a verdadeira maturidade e identidade artísticas. Esperto e bom de fazer amizade, o cantor passa a andar pelas comunidades e contar o dia a dia das pessoas que ali moravam. Nas músicas, ele falava sobre malandragem, crime e a dura vida das pessoas que ali residiam. Também passou a encontrar parceria com desconhecidos, gravando músicas feitas por sambistas da própria favela. Essa forma de construção artística, desenvolvida pelo cantor, alçou Bezerra da Silva como a voz mais potente sobre a realidade da periferia. Tudo isso pelo menos duas décadas antes da popularização do Hip Hop, gênero famoso por abordar essas temáticas.
Foi aí que surgiram suas músicas mais famosas: “Malandragem Dá um Tempo”, “Sequestraram Minha Sogra”, “Bicho Feroz”, “Overdose de Cocada”, “Meu Pirão Primeiro”, “Lugar Macabro”, “Pai Véio 171”, “Candidato Caô Caô”. A partir desses trabalhos, o cantor virou campeão de vendas de discos e se transformou em nome conhecido nacionalmente.


Em 1995, pegando a onda dos famosos artistas italianos “Os três Tenores”, Bezerra se junta a Dicró e Moreira da Silva no álbum “Os Três Malandros In Concert”. O trabalho foi muito bem-sucedido e alçou Bezerra ao panteão dos sambistas de uma vez por todas.


Reverenciado por bandas mais novas como Planet Hemp e o Rappa, Bezerra da Silva fez participação em diversos shows e álbuns.
Em 2001, Bezerra se converte ao cristianismo evangélico e passa a frequentar a Igreja Universal do Reino de Deus.
Em 2005, o cantor é internado no Hospital do Servidor no Rio de Janeiro com pneumonia e enfisema pulmonar. Em 17 de janeiro daquele mesmo ano, o sambista faleceu aos 77 anos.


O corpo se foi, mas o espírito e suas músicas ficaram para a eternidade. Até hoje Bezerra é considerado o homem que melhor falou sobre malandragem e sobre as formas de vivência e convivência nas periferias do Rio de Janeiro.
Algumas frases, ditas em músicas que ele cantou, mostram muito bem como o sambista conhecia as coisas sobre as quais cantava.

“Otário só tem dois direitos: tomar tapa e não dizer nada!”
“Para tirar meu Brasil desta baderna, só quando o morcego doar sangue e o saci cruzar a perna.”
“Malandro é malandro e mané é mané!”

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