Nos anos 1950, os Estados Unidos registravam entre 13 e 20 mil casos de poliomielite por ano. Também conhecida como paralisia infantil, a doença aterrorizava os pais, que deixavam seus filhos trancados dentro de casa no verão, época em que a proliferação do vírus era maior.
Em abril de 1955, veio a tão esperada notícia de que uma vacina havia sido criada. Entretanto, um mês depois, o fato que ficou conhecido como “Incidente Cutter” jogou um balde de água fria na empolgação em torno da vacina e fez com que o programa de imunização fosse suspenso por alguns meses.
Esse fato provocou uma série de melhorias no sistema de fabricação e regulamentação das vacinas, mas também foi causador de uma grande tragédia.
A busca pelo desenvolvimento de uma vacina contra poliomielite começou em 1935. Na época, o cientista americano Jonas Salk criou uma vacina a partir de cepas inativadas através da aplicação de formaldeído em culturas do vírus desenvolvidas em células de rim de macaco.
No ano de 1954, 1,8 milhões de crianças dos Estados Unidos, Canadá e Finlândia foram vacinadas para testar a eficácia da vacina. Diante dos resultados positivos, ela foi aprovada e seis laboratórios receberam autorização para produzi-la.
Um dos laboratórios autorizados era o Cutter Laboratories, na Califórnia. Ele produziu 380 mil doses. Alguns lotes, entretanto, saíram com problema, pois foram utilizadas cepas ativas do vírus. A consequência do erro laboratorial foi trágica. Houve mais de 260 casos de pólio associados à vacina e a transmissões comunitárias a partir de crianças vacinadas com o lote defeituoso. Além disso, outras crianças desenvolveram sintomas de poliomielite como dor de cabeça, rigidez na nuca, fraqueza muscular e febre. 164 crianças tiveram paralisia infantil e 10 morreram.
Os problemas fizeram com que as autoridades americanas suspendessem toda a campanha de vacinação contra pólio e realizassem uma vistoria em todos os laboratórios que produziam a vacina. Os procedimentos de testes de vacina se tornaram bem mais rígidos. A displicência com que o Laboratório Cutter produziu a vacina teve um custo muito alto, resultando na contaminação e morte de crianças.
A falta de planejamento e de um controle mais rígido do processo de fabricação da vacina de poliomielite levou a um resultado terrível para aqueles que contraíram a doença após serem imunizados por uma vacina ineficaz e produzida de forma incorreta.
Esse incidente fez com que o controle vacinas se tornasse bem mais rigoroso nos Estados Unidos. Foi criada a Divisão de Padrões Biológicos (DBS) e uma regulamentação federal, os procedimentos de filtração, armazenamento e testes de segurança também foram revistos e, no outono de 1955, o programa de vacinação contra a pólio foi retomado. A doença foi erradicada em solo americano em 1976.
A pressa, a falta de planejamento e a negligência que marcaram o incidente Cutter tiveram um custo humano muito elevado, fazendo com que todos os procedimentos envolvendo vacinas desde então passassem por um controle bem mais rígido de modo a evitar novas tragédias como aquela.
Referências:
https://www.bbc.com/portuguese/geral-54222884
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702003000500007